sábado, janeiro 17, 2009

GUINÉ - Podia ter sido diferente?

(imagem recolhida na internet)

Assinado pelo sr. Coronel Vaz Antunes, a revista "O Combatente", de Dezembro de 2008, publica um artigo de cujo conteúdo, destaco o seguinte trecho:
«...
A noite estava cerrada. Na nossa frente viam-se as luzes duma povoação senegalesa. Caminhávamos em silêncio. Chegàmos ao local indicado pelo mensageiro da bicicleta, cerca de 1 km. dentro do Senegal, quando se notou a aproximação de um automóvel que parou a duas centenas de metros, do qual saíram dois indivíduos que se dirigiram para nós a pé.
Era o nosso interlocutor.
O agente fez as apresentações e eu estendi-lhe a mão, o que segundo soube mais tarde, o sensibilizou muito. Ele era o representante do PAIGC.
O interlucotor foi directo:
Não venho tratar de nenhum assunto pessoal nem de grupo restrito. Trata-se sim de problemas que dizem respeito a todos os combatentes do PAIGC.
Andamos já há dez anos nesta luta. Somos agora menos do que quando começàmos. Actualmente não nos entendemos com o escalão político. Eles são cabo verdeanos e comunistas, e nós somos guinéus, combatentes e não comunistas. Desejamos apenas uma Guiné melhor. Já chegàmos à conclusão de que, sozinhos, não somos capazes de a fazer, mas se-lo-emos convosco.
A nossa proposta é muito simples: em dia e hora que se combine acaba a guerra, nós seremos integrados nas forças da Guiné, sem recriminação nem vingança; e depois juntos, faremos a Guiné melhor. Tudo isto tem que ser combinado em curto espaço de tempo e com o maior segredo, porque se for descoberto antes do tal dia e hora terei a mesma sorte que outros companheiros meus já tiveram.
...»
.
Sem comentários!
Apenas a minha homenagem ao sr. Coronel Vaz Antunes.
.
A M A R G A S
.
Amarga foi a forma que, imposta,
Nos fez abandonar aquela gente
E que não só podia ser dif'rente
Mas muito mais leal, como resposta.
.
Amarga, na traição que, cometida
Em nome duma falsa liberdade,
Pagou com abandono a lealdade,
De quantos lá viveram toda a vida.
.
Amargas são as lágrimas choradas
Por cada um dos velhos camaradas,
Memórias dos soldados que caíram.
.
Amargas, mais que as horas de combate,
Os sinos não tocarem a rebate,
Por mortos que os governos omitiram.
.
Vítor Cintra
No livro: RECADOS

12 Comentários::

At 18/1/09 1:59 da manhã, Blogger Unknown said...

Curiosamente ainda hoje a Guiné e os combatentes foram bastante falados aqui em casa. O meu sogro esteve lá e diz que a Guiné era o pior sítio, onde a guerra era mais acesa, e onde viu morrer muitos amigos...
Eu, sendo bem mais nova, realmente não ouço o Governo falar do assunto... Uma coisinha aqui, outra ali, mas sem grande relevo ou destaque.
O teu soneto é magnífico Vítor. A forma é sempre de mestre, mas o tema está muito bem abordado.

Beijinhos

 
At 18/1/09 2:09 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Está feito e muito conseguido!! Honras ao Cel. Vaz Antunes e a ti por escreveres com tanta alma este soneto. Beijus

 
At 18/1/09 2:11 da manhã, Blogger Unknown said...

Caro Vitor,
como diz a Vera, a guerra na Guiné foi mais acesa, e eu que estava lá no 25 de Abril, e embora fosse criança na altura lembro-me muito bem de acontecimentos horriveis.
Meu pai era 1º Sargento da Força Aérea, e passámos lá maus bocados.

Belíssima homenagem!

Beijinhos,
Ana Martins

 
At 18/1/09 10:09 da manhã, Blogger Luz said...

teria sido diferente, sem dúvida. mas vendo as Guineenses que todos os dias chegam à minha escola, e as diferenças que existem entre elas (uns com luxo e fausto, outros sem terem que comer), vê-se que o esforço do Cel Vaz Antunes, não resultou.
Pobres Guineenses, a sobreviver nas mãos de loucos...

 
At 18/1/09 10:11 da manhã, Blogger Luz said...

Obrigado pelo belíssimo soneto que dá voz aquilo que muitos de nós sentem...
E Eu nunca estive em Àfrica!...

 
At 18/1/09 10:14 da manhã, Blogger Luz said...

E Desculpa as letras minúsculas e as palavras comidas, (falta "crianças" no primeiro comentário - crianças Guineenses) -
Lá diz o ditado, "Devagar que tenho pressa"...
Bom domingo
Luz

 
At 18/1/09 4:38 da tarde, Blogger Menina do Rio said...

Amargas são as horas feitas de lágrimas, a omissão dos vivos e as dores das perdas...

Um beijo pra ti

 
At 19/1/09 9:43 da manhã, Blogger antónio paiva said...

...

sabes Amigo?

tudo podia e pode ser diferente, quando devia e deve ser - diferente.

um abraço.

 
At 19/1/09 11:13 da manhã, Blogger Teresa Durães said...

uma Guiné esquecida porque não é estratégica nem apetecível

 
At 20/1/09 11:09 da tarde, Blogger . fina flor . said...

ficou bonito o poema :o)

muito bem finalizado!!

beijos e boa semana,

MM.

 
At 21/1/09 11:32 da manhã, Blogger Carla said...

toda a descolonização poderia ter sido feita de outra forma, pelo menos evitando-se guerras e mortes de inocentes.
Belo o teu poema-dedicatória
beijos

 
At 5/2/09 2:10 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Caro amigo,
a vida é um enimga que se baseia sempre na ciência da gratidão ou da traição. Quiçá: dos que tentam a Honra que lhes coube em sorte. Essa sorte tem diversas perspectivas...
Honra aos militares portuguses, principalmente aos que foram assassinados após a independência por terem servido Portugal e os Comandos.

Abraço

 

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