Alguém me disse... Parte 4
A respeito do que penso e do que escrevo...
VAMOS FALAR DE RÓTULOS?
Em comentário feito de frases curtas, mas carregado de significativas insinuações, foi-me manifestado o desagrado pelo meu 'atrevimento' em abordar temas que, ao que parece, continuam a incomodar. Vá-se lá saber porquê...
E o "comentário" começava por questionar-me nestes termos: "Diga-me lá, você é retornado?" 'ipsis verbis'.
* * * * * * * * *
Em bom português "retornar" significa "regressar", ou "voltar ao ponto de partida".
Em bom português, portanto, vamos ver se consigo satisfazer a curiosidade do inquiridor.
.
Na década de sessenta, cumpri serviço militar. Fui mobilizado e embarquei para terras de além-mar, para cumprir uma comissão de cerca 30 meses.
Não fui voluntário! Como não o foram, aliás, a grande maioria dos homens da minha geração. MAS NÃO FUGI!
Regressei vivo e inteiro, graças a Deus. O que, infelizmente, não aconteceu a muitos outros. E, sendo assim, a minha resposta só pode ser, clara e inequivocamente, uma: SOU RETORNADO!
Sei perfeitamente que não era esta a resposta pretendida. Lamento desiludi-lo, senhor "demokrata".
.
Sendo Portugal, durante décadas um país de emigrantes, a pergunta parece até despropositada.
Sê-lo-ia, de facto, não fosse a insidiosa carga negativa subjacente, na linguagem dos auto-intitulados "demokratas" domésticos, surgidos sabe-se lá de onde, no 26 de Abril de 1975.
Hábeis a rotular terceiros, sentem-se, contudo, incomodados, quiçá ofendidos, quando alguém lhes belisca os brios.
Para quem não está a par de tão "demokrática" linguagem, fica o esclarecimento:
"Retornado" foi o rótulo, inventado em 1975 pelos "demokratas" emergentes (quantos deles mantendo ainda o respectivo cartão da UN - bem guardado embora, mas intacto - não fosse o demo tecê-las) para rotular todos os que vinham das antigas colónias, quer fossem retornados, refugiados ou imigrantes. Numa - bem pouco imaginativa, aliás - imitação, de resto, do epíteto "pés negros", inventado em França, cerca de 15 anos antes, para injúria dos oriundos da Argélia.
.
Desse tipo de linguagem me demarco hoje, como o fiz então. E não apenas pelo facto de muitos desses retornados, refugiados e imigrantes me terem recebido lá, num período difícil, com real hospitalidade e inesquecível urbanidade, honrando-me, ainda hoje, com a sua amizade, mas também porque, quem a usa, revela a sua enorme magreza de carácter.
E o "comentário" começava por questionar-me nestes termos: "Diga-me lá, você é retornado?" 'ipsis verbis'.
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Em bom português "retornar" significa "regressar", ou "voltar ao ponto de partida".
Em bom português, portanto, vamos ver se consigo satisfazer a curiosidade do inquiridor.
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Na década de sessenta, cumpri serviço militar. Fui mobilizado e embarquei para terras de além-mar, para cumprir uma comissão de cerca 30 meses.
Não fui voluntário! Como não o foram, aliás, a grande maioria dos homens da minha geração. MAS NÃO FUGI!
Regressei vivo e inteiro, graças a Deus. O que, infelizmente, não aconteceu a muitos outros. E, sendo assim, a minha resposta só pode ser, clara e inequivocamente, uma: SOU RETORNADO!
Sei perfeitamente que não era esta a resposta pretendida. Lamento desiludi-lo, senhor "demokrata".
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Sendo Portugal, durante décadas um país de emigrantes, a pergunta parece até despropositada.
Sê-lo-ia, de facto, não fosse a insidiosa carga negativa subjacente, na linguagem dos auto-intitulados "demokratas" domésticos, surgidos sabe-se lá de onde, no 26 de Abril de 1975.
Hábeis a rotular terceiros, sentem-se, contudo, incomodados, quiçá ofendidos, quando alguém lhes belisca os brios.
Para quem não está a par de tão "demokrática" linguagem, fica o esclarecimento:
"Retornado" foi o rótulo, inventado em 1975 pelos "demokratas" emergentes (quantos deles mantendo ainda o respectivo cartão da UN - bem guardado embora, mas intacto - não fosse o demo tecê-las) para rotular todos os que vinham das antigas colónias, quer fossem retornados, refugiados ou imigrantes. Numa - bem pouco imaginativa, aliás - imitação, de resto, do epíteto "pés negros", inventado em França, cerca de 15 anos antes, para injúria dos oriundos da Argélia.
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Desse tipo de linguagem me demarco hoje, como o fiz então. E não apenas pelo facto de muitos desses retornados, refugiados e imigrantes me terem recebido lá, num período difícil, com real hospitalidade e inesquecível urbanidade, honrando-me, ainda hoje, com a sua amizade, mas também porque, quem a usa, revela a sua enorme magreza de carácter.
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T E M A S
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Deixei, nas rimas breves dos poemas,
Fantasmas, dum passado que me marca,
Surgidos na memória, que os abarca
Aos poucos, revelados nos meus temas.
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Ao longo do percurso duma vida,
Calei um sentimento de revolta
Por mágoas dum passado, que não volta,
Tomadas duma Pátria mal cumprida.
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Não fui um desertor!... Nem deixei penas
Em causas, fossem grandes ou pequenas,
Daqueles que mandaram no país.
.
Calar, porém, aqueles que tombaram,
Desonra os governantes que ficaram,
Mostrando a tacanhez mais infeliz.
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Vítor Cintra
No livro: RELANCES
10 Comentários::
"Retornado",porque ainda dói?
Se passados tantos anos esta palavra ainda perturba,não é pela palavra em si que é como tantas outras,mas sim pelos dramas de vida que lhe estão associados:para os que de cá nunca saíram, a vinda de tanta gente e em tão pouco tempo,significou a dificuldade de emprego"que era certo"entre muitas outras particularidades.Por outro lado, os melhores postos de trabalho também não o foram para os que cá estavam.
Quem veio,porque obrigados e sem que o tenham pedido,deixaram para trás anos e anos de trabalho, todos os bens que possuíam e um estilo de vida bem mais evoluído e prazeroso que este que lhe impingiram.
Se de uma querra entre pessoas se tratasse,diria que ambas as hostes se hostilizaram sem culpa de parte a parte,apenas porque de um miserável país se tratava e trata, e ninguém estava preparado para tão profundas alterações sociais.
Sinto que ambas as partes perderam pedaços das suas vidas jamais recuperáveis,por culpa da insensatez e falta de visão de uns tantos senhores que se borrifaram para as consequências a curto,médio e longo prazo de milhares de seres humanos.
Ainda dói e vai doer á próxima geração.
......
Olá Amigo,
é em momentos assim que apetecia...., não escrevo porque este é um blog de respeito, bem como de alguém que muito estimo
.......................
Abraço
Olá Vítor, ainda não fui de férias e ainda bem que o tempo não convida!
Mais um post muito bem conseguido (nem esperava que sssim não fosse) com resposta à altura da algumas magrezas de espírito que por aí abundam,infelizmente, os tais demokratas que de democratas, muitas vezes, nas acções nada têm!
Parabéns!
Ao longo do percurso duma vida,
Calei um sentimento de revolta
Por mágoas dum passado, que não volta,
Vitor Cintra:
Venho de visita pé ante pé...(é suposto estar de férias...) porque aqui neste espaço sempre encontrei cultura, ausência de "rótulos" e ideais humanistas por isso o visito.
Parabéns!
Beijos
"...
não fosse a insidiosa carga negativa subjacente, na linguagem dos auto-intitulados "demokratas" domésticos, surgidos sabe-se lá de onde, no 26 de Abril de 1975.
"....
e infelizmente continuam a existir ... passados que foram tantos anos ...
sei bem o que isso quer dizer ...
beijinhos
"Retornados" uma palavra muito mal rotulada talvez quem a ultiliza tenha uma grande falta de noção da mesma.
Texto muito bem estruturado e muito bem respondido!!
Bjs Zita
O rótulo me incomoda muito.Reduz as pessoas a um termo simplesmenete.
Um beijo.
Caro Victor, estou de férias, mas mesmo assim não resisto a visitar os amigos e este teu blog é um "ex-libris" para meu regalo.
Meu amigo, essa palavra "retornado" é um nojo.
Recordo que o meu irmão com apenas dez anos lhe perguntavam como era viver no meio dos leões (que falta de cultura...). Recordo também as vezes que o meu falecido e querido avô o tinha que ir esperar à saída da escola porque lhe faziam esperas...por ter nascido em MOÇAMBIQUE!
Recordo também que no Colégio da Via Sacra, onde estudei no ano de 1975, o pof de português dizia na sala de aulas:
- Não têm vergonha que aquele que veio lá dos pretos tire a melhor nota a PORTUGUÊS?
Comigo não faziam farinha, pois tive sempre a capacidade de os mandar pastar com elevação. Mas muitas vezes foi difícil.
Recordo também que, apesar dos tempos conturbados, em que abandonados pelo governo português à sorte das Frelimos, MPLAs e outros, os ditos "retornados" com sentido negativo, fizeram prosperar os negócios, trazendo inovação e abertura a um rectângulo fechado e sem horizonte.
Não foi fácil, como nada é fácil na vida, principalmente depois de um abandono de uma vida a que se tinha dedicado tudo.
Recordo ainda que os meus avós, cerca de um ano antes do 25, vieram à "Metrópole" venderem os terrenitos e casa que tinham na aldeia beirâ e levaram o dinheiro para Moçambique -Portugal!
Ali era a nossa vida e ninguém pensava em "RETORNAR".
Eu nasci em Moçambique, com orgulho.
Com orgulho mesclado de mágoa continuo a amar África e triste vejo este rectângulo infestado de DEMOKRATAS insidiosos e pastelentos destruidores dos ideais Pátrios.
Víctor -obrigado por mais este post MAGNÍFICO!
Mário Relvas
Vítor,
O melhor que temos a fazer é ignorar esse tipo de comentários, porque me parece que eles têm como objectivo fazer com que cada um de nós desista do seu espaço para não ter problemas.
Acho que a melhor resposta que se pode dar a este tipo de situações é ignorá-las e seguir em frente o nosso caminho.
Abraço.
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