terça-feira, maio 29, 2007

CARICATURAS de ontem e de hoje.

(imagem recolhida na internet)

Era eu rapaz, estudava à noite (de dia era necessário ganhar a vida), quando decidi tomar parte numa marcha de protesto estudantil - das muitas que eram tentadas então -. O percurso previsto saía do Campo de Santana e, passando ao lado do Hospital dos Capuchos, descia para a Avenida da Liberdade, pela Rua das Pretas, donde seguiria, via Praça dos Restauradores, até ao Terreiro do Paço (onde, naturalmente, não conseguiu chegar).

Meia dúzia de metros á frente dos marchantes, o amigo "António" compenetrado do seu papel, transportava, debaixo do braço, dentro duma pasta de plástico transparente, um tachinho de barro. A espaços, os seguidores gritavam em coro:

- «Ó António, larga a pasta

O visado, compondo um ar cinicamente ingénuo, retorquia, virando-se para a multidão:

- «E o tacho

E a marcha lá seguia... até que os detentores do poder, enviando uma força policial ao encontro dos manifestantes, resolveram acabar-nos com a festa e... foi o 'salve-se quem puder'.

Comparando a forma de actuar dos políticos de então com o modo de intervir dos actuais, sou forçado a reconhecer a inabilidade daqueles. Criar e manter um efectivo policial às ordens para desencorajar, ou reprimir, críticas ou contestações, é duma pequenez básica. Afinal, os métodos actuais, com a criação de "jobs for the boys and girls" (diligentes e fiéis comissários políticos) são muito mais eficazes, ainda que pouco menos subtis.

Basta ver o refinamento da censura (subsidiar quem louva, perseguir e coagir quem não afina pelo diapasão); basta olhar as consequências que recaiem sobre quem se atreve a comentar as tais licenciaturas(?) obtidas por fax (ainda que daí resultem confusões, inexplicadas e inexplicáveis, com a emissão de diplomas, com datas divergentes, e não só); basta ver o que acontece a qualquer professor que se atreva - mesmo em privado - a repetir a laracha, que todo o país repete, sobre o "sor engenheiro" pinóquio (ainda que o visado, com o cinismo que o caracteriza, argumente só conhecer o que diz a imprensa); basta ver o desprezo com que certos "ba-Canas" falam dos eleitores madeirenses, (por estes terem achado o rosa uma cor demasiado efeminada, preferindo o laranja?); basta ver o encarniçamento contra os habitantes da margem sul (afinal filhos dum deserto), com uma tendência acentuada para gostarem das cores benfiquistas, em desfavor do tal rosa (se bem que, neste caso - temos que reconhecer - a perigosa ideia de estragar o negócio dos terrenos aos compadres, mereça todos os encarniçamentos e as ameaças das piores desgraças, como as do risco de bombas nas pontes).

Há dúvidas, de que nesta "demokracia de faz de conta", qualquer semelhança com uma verdadeira DEMOCRACIA, é mera coincidência?

.
D E G R A D A Ç Ã O

São muitos os que querem ter o nome
Falado, como os nomes mais ilustres,
E servem-se de guerras e de fome,
Intrigas, ou trapaças e embustes.

E quantos não forjaram, no segredo
Das mais inconfessadas safadezas,
Domínio sobre os povos, pelo medo,
E nele construíram tais grandezas.

À força de pisarem gente honesta,
Anónima, joguete de ganância
Que nem poupa sequer a própria infância,

Assumem como bom o que não presta,
Se tal puder servir os seus intentos,
Embora cause a outros sofrimentos.

Vítor Cintra
No livro: RECADOS

10 Comentários::

At 29/5/07 10:41 da manhã, Blogger Isabel Filipe said...

"Há dúvidas, de que nesta "demokracia de faz de conta", qualquer semelhança com uma verdadeira DEMOCRACIA, é mera coincidência?
"

Claro que não existe qualquer dúvida e as palavras do teu poema não podiam ser melhores para descrever o país onde vamos vivendo ...

bjs

 
At 29/5/07 3:11 da tarde, Blogger leituras said...

Se tudo isto não fosse preocupante, seria até para ser tomado como anedotico.

O poema é mais uma lição com a objectividade de sempre.

Boa semana

 
At 29/5/07 4:12 da tarde, Anonymous Anónimo said...

J. Vitor, teu texto revela toda tua indignação e em mim, fala fundo pela "DemoKracia" coincidente com a nossa. Será mera coincidência?

O Poema... ahh... esse poderia até ter sido inspirado nos 'poderosos' brasileiros!

 
At 29/5/07 8:14 da tarde, Blogger antónio paiva said...

....................

Amigo,

cá para mim isto resolvia-se com uma revolta silenciosa

dizem que o voto é a arma do povo, pois então eu sugeria que o povo não a disparasse

o não ao voto, não não não não


até porque, sempre, sempre, que a cor muda

mudamos de moleiro mas não mudamos de ladrão

farto!
farto!
farto!
...............

farto de todos eles!

...........................

Abraço e noite serena

 
At 30/5/07 3:48 da manhã, Blogger Odele Souza said...

Querido amigo,

A palavra, quer escrita, quer falada, é um recurso que dispomos para demonstrar nosso repúdio à DEGRADAÇÃO, Você, poeta que é, usa esse recurso com maestria.
Fique com meu carinho e admiração.

 
At 30/5/07 5:53 da manhã, Blogger . . . .Filho da Poesia. . . . . said...

Gostei do blog. Vamos trocar links?? Pode adicionar o meu se quiser. Me confirme para que eu adicione o seu.

http://filhosdapoesia.blogspot.com

Abraços poéticos...

 
At 30/5/07 6:26 da tarde, Blogger Ana said...

Nesta espécie de democracia só os ricos e poderosos safam-se e como sempre a corda rebenta do lado mais fraco.
beijos

 
At 2/6/07 3:44 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Um Poema - Vítor Cintra:

Só quem tem o dom da escrita é que efectivamente pode fazer poemas deste quilate. Parabéns meu amigo. Um abraço.

 
At 2/6/07 6:38 da tarde, Blogger Rosa Silvestre said...

Olá Vítor. vou enviar-te um par de socrát....Ops, quero dizer de tomatinhos para colocares à esquerda (selo)!
BOM FIM-DE-SEMANA!

 
At 6/6/07 1:38 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Democracia?Onde? Só se for no "deserto" dos ideais dos ministros.

Triste sina a deste País, governado por tarântulas gulosas!!Que falam depois de almoços de bom vinho...

inté

Mário

 

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