segunda-feira, outubro 27, 2008

A PROPÓSITO DO ORÇAMENTO


Este embandeirar em arco à volta das milagreiras virtudes deste O.G.E. para 2009, faz-me lembrar aquela história, que o meu patrício contava, sobre a bondade dos ladrões, por lhe darem um chouriço depois de lhe roubarem o porco.
Afinal, o que é que este Orçamento nos traz, além de muita treta e pouca substância?...
- É a possibilidade de aumentar as deduções dos juros, dos empréstimos à habitação, no IRS das famílias com menores rendimentos ?... Mas se essas já não pagam IRS por não terem rendimentos, em que é que beneficiam com a medida?
- É a criação de um escalão de 12,5% de IRC para os primeiros 12.500 € do rendimento colectável das empresas?... Mas se os valores (e não são tão pequenos assim) do Pagamento Especial por Conta do IRC continuam a ser obrigatórios e nunca são devolvidos aos contribuintes, quer eles tenham ou não rendimentos tributáveis, em que é a medida alivia a carga fiscal das pequenas e médias empresas?
De concreto, que melhore a nossa vida, o que é que este Orçamento contem?...
Há poucos meses atrás, numa populista operação de charme, badalada pela bem «remunerada» imprensa, foi-nos servido um espectáculo de ministros apregoando o milagre socialista de uma descida de 4 décimas nos números do desemprego, em época de empregos sazonais. Porque é que, depois de tão monumental espectáculo, não se prevêem, neste O.G.E, medidas visando, pelo menos, o não agravamento, em 2009, dos números do desemprego?... Que acções de combate ao desemprego se consagram no Orçamento?...
Duma ponta à outra deste O.G.E. - da taxa de crescimento, à receita, ou ao défice público anunciados - o realismo está tão distante que cabe perguntar: - Se o panorama é tão azul, porque é que o número de execuções, penhoras e arrestos continua a crescer?
A propaganda habitual ao redor de «uma mão cheia de nada»?...
É claro que a incompetência nunca é culpada. Até agora, a desculpa eram os três anos de governação dos outros. Agora, decorridos três anos de erros grosseiros, passará a culpa a ser da crise internacional, apesar das certezas sem fundamento do sr. Sócrates, de que a crise não vai chegar cá, e das afirmações gratuitas do «dr. Penhoras» de que a economia vai crescer disparates.
E as chamadas «oposições» (se é que as há) dizem o quê?
Haja compaixão para tanta cegeuira!
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R O B I N
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Robin dos Bosques roubou
Aos ricos p'ra dar aos pobres.
E tudo o que nos chegou,
De quanto a história contou,
Nos fala de gestos nobres.
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"Sherifes" sempre tivemos,
São Bento sabe-o bem.
Mas estes, que conhecemos,
- Teixeira, Sócrates - vemos
Que sacam cada vintém.

Ao Santos chamam-no já
Anti-Robin assumido,
Aos pobres - e tantos há -
Saqueia tudo o que dá
Aos ricos do seu partido.

Pinóquio, chamam ao outro,
P'lo muito que sempre mente.
Promessas em cada sopro
Tresandam, como um arroto,
Desprezo por toda a gente.
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Vítor Cintra
No livro: AFAGOS

quarta-feira, outubro 22, 2008

BANGUI - República Centro Africana

(imagem recolhida na net)
Bangui, nas margens do rio Ubangui, vive hoje na solidão da floresta equatorial, fora das rotas do mundo e de costas para o progresso, de que a "independência" a divorciou.
Vindos de Cabinda, os portugueses subiram o rio Congo e depois o Ubangui e chegaram à República Centro Africana, cerca dos anos trinta do século XX. Tornaram-se grandes comerciantes, madeireiros, fazendeiros de café.
Em consequência da insegurança que a "independência" gerou, também eles foram partindo, restando apenas algumas, poucas, famílias tentando encontrar coragem para dizerem adeus.
Antes dos portugueses, haviam chegado os árabes do Sudão, na segunda metade do século XIX. Levaram praticamente todos os habitantes do Leste, como escravos. O território do Leste, cerca de três vezes maior do que Portugal, tornou-se, e permanece ainda até hoje, terra de bichos, de floresta e santuário de um ou outro grupo rebelde nacional, do Chade, do Sudão, do Congo ou mesmo do Uganda.
Outros chegaram depois dos árabes e antes dos portugueses. Contudo, da sua passagem poucos vestígios restam já.
Hoje já quase ninguém visita Bangui. O país como que desapareceu, meio perdido no centro de África e a sua capital está já classificada como uma das piores urbes do planeta.
(Fonte de informação: Victor Ângelo - Vice-Secretário-Geral da ONU)
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A P E L O
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Ó tu, deusa maior da lusa gente,
Que, nas histórias vivas do passado,
Osaste, com olhar mais indulgente,
Deixar-nos ver da terra um outro lado;
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Ó tu, Moira seráfica, sem tempo,
Chegada à Lusitânia noutra era,
Que deste aos portugueses mor alento,
Capaz de derrotar qualquer Quimera;
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A nós, que somos filhos desse povo
A quem, por protecção de Juno e Marte,
Deixaste que chegasse a toda a parte,
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Tecida a nossa vida em fio novo,
Demonstra que a coragem doutros tempos
Apenas nos deixou por uns momentos.
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Vítor Cintra
No livro: DESABAFOS

quarta-feira, outubro 15, 2008

CASO MADDIE - O que o processo esconde

(imagem recolhida na internet)

Sob o título em epígrafe, com o subtítulo «Nomes e moradas de possíveis agressores sexuais estiveram a um fio de se tornarem públicos», e ilustrado com uma fotografia do casal McCann, a revista VISÃO publica no nº 806, de 14 de Agosto de 2008, um trabalho do jornalista Tiago Fernandes, de que destacamos:

«... o vídeo dos dois cães pisteiros ingleses no apartamento de onde Maddie desapareceu não foi a única peça processual vedada aos jornalistas. Um volume contendo uma listagem de dezenas de britânicos, um português e um francês conotados com crimes sexuais (com moradas e contactos), bem como os e-mails das pessoas que os denunciaram às autoridades, manteve-se em segredo de justiça. Mas foi por um triz - e graças ao protesto da polícia inglesa - que estes sensíveis documentos não caíram no domínio público. ...»
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- Porque será que os nomes dos pedófilos continuam a ser tabu?
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Ainda que o desaparecimento desta menina possa não ser da responsabilidade de nenhum pedófilo - como parece ser convicção cada vez mais partilhada - a questão não perde pertinência. Porquê o tabu?
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T R A P A Ç A S
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É quando nos detemos a pensar
No mundo, que podia ser dif'rente,
Que vemos que, afinal, há tanta gente
Que vive toda a vida a trapaçar.
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Trapaças ao amor, quando há traição,
Trapaças por prazer, mas sem afecto;
Trapaças, até sob o mesmo tecto,
Com faltas de respeito ou correcção.
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Trapaças ontem, hoje e amanhã,
Ditadas por orgulho ou glória vã,
Constantes no correr do dia a dia.
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Trapaças, todas fruto de egoísmo,
Impõem-se no mundo, com cinismo,
E tornam tanta gente tão vazia.
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Vítor Cintra
No livro: RELANCES

quinta-feira, outubro 09, 2008

Quando o roubo muda de designação...

Sob o título:
«Polícia Marítima apreende 14 toneladas de corvina» pode ler-se em IOL Diário a seguinte notícia, divulgada em 25-09-2008:
«Catorze toneladas de corvina foram apreendidas esta quinta-feira na Doca Pesca em Sesimbra, informou à Lusa fonte da Polícia Marítima.
A Polícia Marítima explicou que a apreensão deveu-se ao facto de a quantidade pescada ser superior à permitida por lei.
Nesta operação que decorreu entre as 9:30 e as 15:00, estiveram envolvidos seis agentes da Polícia Marítima de Sesimbra com três embarcações.»

Só que a notícia não pode terminar aqui. Falta dizer que o peixe apreendido foi depois vendido, pelas autoridades responsáveis pela apreensão, a 0,18 € cada kg (...é isso mesmo: 18 cêntimos).

Dá vontade de perguntar:
- Será que apreendendo o peixe a pesca superior já não terá acontecido?
- Será que o produto da venda (os 0,18 € por kg) foi atirado ao mar, no lugar do peixe pescado em excesso?
- Será que "o crâneo" que mandou apreender o peixe, por entender que se tratou de pesca superior, soube explicar aos pescadores como devem avisar as corvinas para não entrarem na rede a partir da meia dúzia?
- Será que, quando os pescadores vão à faina e não pescam nada, o tal "crâneo" vai passar a compensá-los?...

Não sei como, mas certamente que o fará, já que, a não ser assim, teríamos que aceitar como verdadeira a interpretação daqueles que dizem que esta acção não passou de um roubo.
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P E S C A D O R
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Olhando o oceano, o pescador
Mergulha na distância o olhar triste,
Alheia-se do mundo ao seu redor
E vive da lembrança, que persiste.
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É velho!... Já não pode agora tanto!...
O tempo, que o 'sgotou pelo cansaço,
Aumenta-lhe na alma a dor do pranto,
Que o rosto não chorou, por embaraço.
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Aos netos, com saber outrora feito,
Contando vai lições, que tem da vida,
Sem nunca confessar que foi sofrida.
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Cansado, o coração mantém, no peito,
Cadência de batida. Ainda assim,
Ao som do marulhar do mar sem fim.
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Vítor Cintra
No livro: DIVAGANDO

quarta-feira, outubro 01, 2008

"DESTAK"


Blog Destak, de Setembro/2008

Entendeu Isabel Filipe distinguir esta página como um dos "Blog Destak" do mês de Setembro.
Desconheço os critérios que presidiram à selecção para a atribuição deste prémio, mas conhecendo o elevado sentido estético da autora, é, sem dúvida, uma honra enorme poder exibir este selo.
O poema que se segue, com dedicatória para a Isabel, é uma forma de lhe manifestar reconhecimento.

M E M Ó R I A S

Muito mais do que um desejo
Ou simples necessidade,
Conto sempre co'a verdade,
Ao registar o que vejo,
Mesmo só no pensamento.
Busco, depois, na lembrança
Idas a tempos passados,
Quando sinto que, marcados,
Uns tempos são, pela esp'rança
E outros p'lo sofrimento.

Vítor Cintra
No livro: AO ACASO